sexta-feira, 19 de novembro de 2010

OPINIÃO - Matéria decidida por juiz incompetente só pode ser reapreciada se não prejudicar réu

Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ, a "Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus para absolver dois empresários acusados de fraude a licitação por elevação arbitrária de preços e onerosidade injustamente excessiva da proposta. Os empresários haviam sido absolvidos pela Justiça estadual, em sentença transitada em julgado em 12 de junho de 2002, mas foram condenados a três anos de reclusão em nova ação, referente aos mesmos fatos, dessa vez proposta no âmbito da Justiça federal.

A decisão do caso é interessante no que tange à discussão de conceitos processuais, em especial, a natureza da decisão feita por juízo incompetente. Prescindindo da análise meritória, no caso em análise, os réus haviam sido inocentados pela Justiça Estadual do Ceará por crime de fraude a licitação. Após transitada a sentença em julgado, o Ministério Público ingressou com nova ação, com o mesmo objeto, agora perante a Justiça Federal, uma vez que o lesado seria a União. 

O desembargador convocado do Ceará, Haroldo Rodrigues, que é o relator do caso, sustentou que, embora a sentença inicial houvesse sido proferida por juízo absolutamente incompetente, sendo, portanto, nula, ela pode "acarretar o efeito de tornar definitiva a absolvição do acusado, após transitar em julgado, uma vez que tem como consequência a proibição da “reformatio in pejus”, que é a impossibilidade de reforma da sentença penal em prejuízo do réu".

Ainda, considerou que "ainda que a nulidade seja de ordem absoluta, eventual reapreciação da matéria não poderá de modo algum ser prejudicial ao paciente, isto é, à sua liberdade. Não se trata de vinculação de uma esfera a outra, mas apenas de limitação principiológica", em voto acompanhado pelos demais integrantes da Sexta Turma que concedeu o Habeas Corpus (HC 146208) aos réus.

A decisão, ao meu ver, é no mínimo polêmica. A incompetência absoluta, hipótese deste caso concreto, é disciplinada pelo art. 113 do Código de Processo Civil, nos seguintes dizeres:

Art. 113. A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção.
§ 1o Não sendo, porém, deduzida no prazo da contestação, ou na primeira oportunidade em que Ihe couber falar nos autos, a parte responderá integralmente pelas custas.
§ 2o Declarada a incompetência absoluta, somente os atos decisórios serão nulos, remetendo-se os autos ao juiz competente.
 Desta feita, na intelecção emanada pelo referido artigo, resta claro que a incompetência absoluta é uma particularidade processual que se sobrepõe a toda e qualquer outra regra do processo. Quis dar o legislador a maior importância possível ao respeito à competência, em sua forma absoluta.

Assim, salvo entendimento em sentido contrário, parece-me que o citado dispositivo processual tornaria a sentença como inexistente no plano fático-jurídico. No entanto, ao sopesar os princípios conflitantes preferiu o desembargador convocado (como é a orientação geral do ordenamento jurídico pátrio no presente momento, influenciado, de sobremaneira, pelo pensamento garantista), garantir o direito do réu de que a sentença que o inocentou, se transitada em julgado, não pode ser reformada, pelo princípio da proibição do "reformatio em pejus", vale dizer, a reforma de uma sentença em desfavor do réu.

Por óbvio a questão possui dois lados e, ambas as posições, ao meu ver, parecem juridicamente razoáveis e lógicas. Cabe, apenas, fazer a ponderação principiológica da maneira subjetivamente mais adequada.

Para ler a matéria no site do STJ, clique aqui.


Para ver o andamento do Habeas Corpus nº 146.208, clique aqui.

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