Fonte: STJ
No contrato de seguro de veículo que dá
direito à cobertura somente em casos de roubo, furto, colisão e incêndio, a
ocorrência de apropriação indébita (quando o sujeito indevidamente toma posse
de um bem que não lhe pertence) não entra como risco segurado.
Esse foi o entendimento da Quarta
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do recurso especial
interposto por uma empresa de construção contra a seguradora Bradesco.
A empresa celebrou contrato de seguro de um carro (utilizado nos serviços
prestados por ela). O contrato previa cobertura do bem em casos de furto,
roubo, colisão e incêndio. A empregada que tinha a posse do carro, após ser
demitida, não o devolveu, por, supostamente, não ter recebido verbas
indenizatórias esperadas.
Indenização negada
Sem o veículo, a empresa ajuizou ação de busca e apreensão, porém o bem não
foi encontrado. Então, formalizou pedido de indenização à seguradora, que se
recusou a pagar o valor correspondente, ao argumento de que não havia ocorrido
furto ou roubo, mas apropriação indébita – hipótese não coberta pelo contrato.
Em primeira instância, o juiz deu razão à Bradesco Seguros. Ele concluiu que a
cláusula contratual não deveria ser interpretada do modo mais favorável à
empresa cliente, principalmente porque o contrato foi claro quanto aos riscos
assumidos pela seguradora.
A sentença foi mantida em segundo grau. O tribunal entendeu que, embora o
contrato de seguro seja protegido pelas disposições do Código de Defesa do
Consumidor (CDC), o pedido de indenização não poderia ser atendido, porque a
perda do bem por apropriação indébita não estava na lista dos riscos segurados.
Interpretação das cláusulas
Contrariada, a empresa interpôs recurso especial no STJ. Sustentou que a forma
como as cláusulas restritivas do contrato foram elaboradas dificultou a
compreensão, em ofensa aos artigos 46, 47 e 54, parágrafo 4º, do CDC.
Afirmou que, no entendimento popular, a cobertura para furto e roubo abrange
todas as espécies de perda do bem, inclusive o crime de apropriação indébita.
O relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão, votou a favor da
pretensão da empresa. Ele esclareceu que os artigos 6º, inciso III, e 54, parágrafo
4º, do CDC, estabelecem que é direito do consumidor a informação plena do
objeto do contrato.
“Ao segurado que teve seu patrimônio subtraído por terceiro, é indiferente a
qualificação jurídica do tipo penal prevista no contrato de seguro, porquanto o
consumidor não é obrigado a conhecer a diferença técnica entre furto, roubo e
apropriação indébita”, disse.
Entendimento que prevaleceu
Após pedir vista do processo para analisar melhor o caso, o ministro
Antonio Carlos Ferreira divergiu do relator. Para ele, “o seguro deve ser
interpretado à luz do que foi contratado”.
Ele mencionou que os riscos predeterminados pelo contrato são levados em conta
no momento da fixação do valor a ser pago, com base em cálculos elaborados
pelas seguradoras.
Explicou que o risco de um empregado deixar de devolver um carro de propriedade
da empresa, utilizado por ele, é diferente daquele relacionado ao furto ou
roubo. “São tipos distintos de conduta criminosa e de risco”, afirmou.
Ele mencionou entendimento da Terceira Turma do STJ no julgamento de um caso
semelhante, em que não houve devolução do veículo emprestado a um amigo, pelo
segurado (REsp 917.356).
Concluiu o ministro Antonio Carlos Ferreira: “Considerando a expressa previsão
da cláusula contratual sobre os riscos objeto de cobertura, não há como a
recorrente afirmar não ter ciência do que estava sendo segurado.” O ministro
destacou, ainda, a existência de seguro próprio para cobrir o risco decorrente
de atos praticados por empregados, o denominado “seguro fidelidade”.
A Quarta Turma, em decisão majoritária, negou provimento ao recurso especial,
ficando vencido o relator Luis Felipe Salomão.
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